terça-feira, 27 de outubro de 2009

quando perdemos a beleza de nos acompanhar, deixamos escapar a dádiva sensação de nos possuir, de sermos só nós.

e diante de tanto egoísmo que nos tranca, percebi que minha rejeição a casamentos é simplesme fobia de ambientes fechados.

não adianta abrir a janela, nem nos sonhos nos pertencemos mais.

CAETANIZAREI TUDO AO REDOR PARA COMPLICAR O ÓBVIO E SENTIR O TIMBRE DE SEU CALOR, meu caro.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Eu e O²

Tudo é absolutamente sequencial e lógico.
Excessos conduzem a excessos desmesurados. E foi assim que mais uma vez travei batalha com minha garganta, meu sono, minhas vísceras. Dias sensacionalmente desregrados tentando canalizar todo esse estresse que habitualmente tem me consumido nos fins de ano, eu exagerei. E colhi febre, risadas, insônias, trabalho, viroses...
Tudo valeu a pena e eu tão-só teria dormindo duas horas a mais. Enquanto todo mundo quer uma dose a mais com duas pedras de gelo, quero apenas duas horas absolutamente entregue a inação consciente e necessária.
Pois bem. Dodói, como dizia minha avó, não deixei os horários se atropelarem e descumprirem seu curso. E nessa, as coisas só se intensificaram: dor, garganta, fome, sono... Até que num ataque súbito de tosse resolvi decidir aquela situação e fui ao óbvio. Fui ao médico. Eu tenho plano de saúde, eu pago minhas contas e não costumo pedir favores. Sim, fui ao médico, a uma clínica renomada. Chegando lá, sem ar, esbaforida, quente, voz anasalada, pergunto:

- Boa tarde, moça! (Sim, para mim todas são moças!) Gostaria de saber se esta é a ala particular (Perguntei para me certificar por que tinha tanta mosca que achei que era dia de consulta para elas).
- Sim. Quem é o paciente? (Insensível assim, juro!)
- EU! (Até então eu achei que minha cara estava igual ao do
Sexta-feira na despedida do Robson Crusòe...)
-Sei... Assina aqui, aqui também. Só mais aqui.

Eu estranhei. Estranhei mesmo. Se eu sou apenas, aparentemente uma, e por mais que possa me multiplicar em meus dizeres e não dizeres, por que 03 autógrafos? Precisava tanto de ar que relevei e escondi minha consciência embaixo do cerebelo.
A moça continuou indiferente até que pediu minha identidade. Entreguei minha carteira da OAB e mais uma vez escutei:

- Nossa, não parece!

No auge da minha delicadeza perguntei:
- Não parece o que?

E ela:

- Que você é advogada!

Nessa hora veio uma vontade estratosférica de colocar a atendente em seu lugar. Que espécie de intimidade repentina ela achou que tinha comigo para me chamar de você?
De você eu chamo meus amigos, companheiros de ceva, meu cachorro imaginário, meu analista invisível.
Mas faltava-me ar e eu nada disse. Engoli a seco, valorizando o oxigênio que nos mata.
Singelamente, ainda disse. Não me podia refutar de ser eu mesma, até sem ar:

- Pois é, para ser advogada nem precisa parecer, basta ter um número na OAB. Fácil , né?

Num sorriso monalisense, indicou-me as cadeiras de espera.
E lá fui eu. Sentei. E eu, sendo eu e sem ar, pensei em fazer xixi e daí deu vontade de fazer xixi e eu tenho toque, banheiro de hospital não é boa pedida. Banheiro de hospital particular com cara de que tem um diretor judeu não é, de fato, boa pedida. Aposto que economizam no detergente.
Ai, ui, ui , ai.. Bancando o Chapollin, invoquei a deusa da higiene como mantra pensei !! “ Sigam-me os bons” e lá fui...
CLARO, ESTAVA SUJO E INAPROPRIADO!
A situação era tão ruim que maiores delongas se fazem desnecessárias.
Voltei e me sentei nas cadeiras, perguntando para mosca ao lado se tinha alguém naquele lugar.
Sem , ar. Oxigênio!!
Júlia.. Uma voz longe...
Júliaaaaaaaaaaaaa uma voz longe e imperativa.
JÚLIA uma voz longe, imperativa e aborrecida.
Olhei para a atendente. E com um sinal entendi que era o médico me chamando para a minha consulta particular num hospital particular. Perguntei:

- Moça, é assim que os pacientes são recebidos? Com tamanha delicadeza?
- Sim.

Eu estava sem ar. Com raiva de toda aquela situação. Com pena de mim por estar ali só. Até então estava decidida a entrar.. Até que ele, o Dr. berrou novamente meu nome.
Meu nome, o nome de qualquer pessoa tem um valor, nunca deve ser berrado e sim pronunciado com todo o respeito que lhe é inerente. O nome é o que nos identifica e delimita nosso espaço em qualquer passo que damos. Muito mais que junção de letras, um nome representa uma história.
Não sou adepta a apelidos justamente por causa disso e não vejo razão, sentido para não encarar como desrespeito o gesto de um estranho, que eu estou pagando , berrando meu nome.
A importância do nome vai além: quando queremos retirar a identidade de alguém, ferir-lhes na intimidade os reduzimos a uma referência, a um número, a um parentesco vulgar.
Nas prisões, os indivíduos medievais deixavam de ser assim considerados e passavam a ser denominados tão-só por um número sequencial.
Sim, tudo isso me veio a mente.
Naquele momento percebi que todo o oxigênio economizado tinha se justificado exatamente ali.
Entrei na sala, peguei os três papéis que havia assinado, depois de indagada disse que meu nome era JÚLIA DA NÓBREGA e que eu naquele momento estava dispensando os serviços do DR.
Ele sem entender perguntou o que eu tinha, respondi que nada mais, que havia acabado de devolver minha consciência ao seu devido lugar, que o ar tinha voltado e que nenhuma circunstância é capaz de emburrecer ninguém quando se há auto-respeito.
Disse, oportunamente, que não achava certo o tratamento dispensado pelo Dr.
Posto se fazia comigo, imaginava o que não faria aos menos letrados. Respondi que era advogada e pós-graduada e seguidora dos Direitos Humanos e da humanização da medicina. E que não entendia a indiferença do Dr.
Expliquei que havia notado que a demora para ele me atender foi uma discussão improdutiva de cerca de 35 minutos sobre a saída de Joel Santana do comando da seleção dos BAFANA-BAFANA.
Ele se desculpou. E eu vi que tinha mal empregado o oxigênio.
Havia a volta para casa.
Examinou-me ala pai-de-santo e como o dr. Frittz começou a psicografar uma receita com 03 antibióticos.
Fiquei analisando a situação. Sequer tinha feito o teste do toque em mim e mesmo assim me julgava necessária a tais venenos. Por certo queria se vingar do meu ataque súbito de civilismo.
Recebi a receita, mas não lhe apertei a mão. Ele não merecia; e sem dar tempo de sair da sala olhei com indiferença a receita e segui meu rumo.
Vim para casa. Dormi. Acordei para escrever estas palavras e o ar puro das montanhas é todomeu.
Tem dias que o nosso oxigênio é bem mais que O².
Tem dias que a gente só não respira se não quiser.
Tem dias que dormir é contemplar o belo e a gente aprende que as coisas são seqüenciais e que para a maioria de seus males nós mesmos somos o antídoto.